Que é a ideologia
hegemônica no Ocidente, há três décadas. Como surgiu, foi adotada
pelas elites e tornou-se invisível e difusa. Quais seus paradoxos.
Por que esquerda fracassou, até agora, em enfrentá-la.
Por George Monbiot |
Tradução: Inês Castilho
Fonte: Outras Palavras
Imagine se a
população da União Soviética nunca tivesse ouvido falar de
comunismo. A ideologia que domina nossas vidas não tem nome, para a
maioria das pessoas. Mencione-o numa conversa e você verá que seu
interlocutor dá de ombros. Mesmo que tenha ouvido o termo antes,
encontrará dificuldade para defini-lo. Neoliberalismo: você sabe o
que é isso?
O anonimato é tanto
sintoma quanto causa de seu poder. Desempenhou um papel importante
numa notável sequência de crises: o derretimento financeiro de
2007-8; o ocultamento de riqueza e poder de que os Panama Papers nos
oferecem apenas um vislumbre; a lenta derrocada da saúde e da
educação públicas; o ressurgimento da pobreza infantil; a epidemia
de solidão; o colapso dos ecossistemas; a ascensão de Donald Trump.
Mas respondemos a essas crises como se elas emergissem isoladas,
aparentemente inconscientes de que foram todas ou catalisadas ou
exacerbadas pela mesma filosofia coerente; uma filosofia que tem –
ou tinha – um nome. Pode haver maior poder do que operar
anonimamente?
O neoliberalismo
tornou-se tão penetrante que raramente o reconhecemos sequer como
ideologia. Parecemos aceitar a proposição de que essa fé utópica
e milenar descreve uma força neutra; uma espécie de lei biológica,
como a teoria da evolução de Darwin. Mas essa filosofia surgiu como
a tentativa consciente de remodelar a vida humana e mudar o locus do
poder.
O neoliberalismo vê
a competição como característica definidora das relações
humanas. Ela redefine os cidadãos como consumidores, cujas escolhas
democráticas são melhor exercidas ao comprar e vender – um
processo que supostamente recompensa o mérito e pune a ineficiência.
Sustenta que o “mercado” assegura benefícios que jamais poderiam
ser conseguidos pelo planejamento.
Tentativas de
limitar a competição são tratadas como hostis à liberdade. A
ideologia afirma que impostos e regulação deveriam ser reduzidos;
serviços públicos, privatizados. A organização do trabalho e a
negociação coletiva pelos sindicatos são retratadas como
distorções do mercado, que impedem a formação de uma hierarquia
natural entre vencedores e perdedores. A desigualdade é
requalificada como virtuosa: um prêmio para a utilidade, ela é
geradora de uma riqueza que se espalha de cima para baixo,
enriquecendo todo mundo. Os esforços para criar uma sociedade mais
igualitária seriam ao mesmo tempo contraproducentes e moralmente
corrosivos. O mercado asseguraria que todo mundo recebe o que merece.
Internalizamos e
reproduzimos estas crenças. Os ricos se convencem de que adquiriram
sua riqueza por mérito, ignorando as vantagens – tais como
educação, herança e classe social – que podem ter ajudado a lhes
garantir isso. Os pobres começam a se culpar por seus fracassos,
mesmo quanto pouco podem fazer para mudar as circunstâncias de suas
vidas.
Esqueça o
desemprego estrutural: se você não tem trabalho é porque não é
empreendedor. Esqueça os custos impossíveis da moradia: se seu
cartão de crédito está no limite, você é imprudente e
imprevidente. Esqueça que seus filhos não têm mais uma quadra de
esportes na escola: se ficam gordos, é falha sua. Num mundo
governado pela competição, aqueles que ficam para trás passam a
ser definidos e a se auto-definir como fracassados.
Entre os resultados,
como documenta Paul Verhaeghe no livro What About Me?, estão
epidemia de automutilação, distúrbios alimentares, depressão,
solidão, ansiedade por desempenho e fobia social. Não surpreende
que o Reino Unido, onde a ideologia neoliberal vem sendo aplicada com
maior rigor, seja a capital da solidão na Europa.
Agora somos todos
neoliberais
O termo
neoliberalismo foi cunhado numa reunião de 1938, em Paris. Entre os
participantes, havia dois homens que definiriam a ideologia, Ludwig
von Mises e Friedrich Hayek. Ambos exilados da Áustria, eles
consideraram a social democracia, caracterizada pelo New Deal de
Franklin Roosevelt e o desenvolvimento gradual do Estado de bem-estar
social da Grã Bretanha, como manifestações de um coletivismo que
ocupava o mesmo espectro do nazismo e do comunismo.
Em The Road to
Serfdom (O Caminho da Servidão), publicado em 1944, Hayek
argumentava que o planejamento governamental, ao esmagar o
individualismo, levaria inexoravelmente ao controle totalitário.
Como o livro Bureaucracy, de Mises, The Road to Serfdom foi
amplamente lido. Chamou a atenção de algumas pessoas muito ricas,
que viram na filosofia a oportunidade para libertar-se de impostos e
regulação. Quando, em 1947, Hayek fundou a primeira organização
que iria espalhar a doutrina do neoliberalismo – a Sociedade Monte
Pelèrin –, ela foi sustentada financeiramente por milionários e
suas fundações.
Com tal apoio, ele
começou a criar o que Daniel Stedman Jones descreve, em Masters of
the Universe, como “uma espécie de Internacional Neoliberal”:
uma rede global de acadêmicos, homens de negócios, jornalistas e
ativistas. Apoiadores ricos do movimento fundaram uma série de
thinktanks que iriam refinar e promover a ideologia. Entre elas estão
o American Enterprise Institute, a Heritage Foundation, o Cato
Institute, o Institute of Economic Affairs, o Centre for Policy
Studies e o Adam Smith Institute. Também financiaram departamentos
acadêmicos, particularmente nas universidades de Chicago e Virginia.
Conforme evoluiu, o
neoliberalismo tornou-se mais estridente. A visão de Hayek de que os
governos deveriam regular a competição para prevenir a formação
de monopólios deu lugar – entre apóstolos norte-americanos tais
como Milton Friedman – à crença de que o poder monopolista
poderia ser visto como uma recompensa à eficiência.
Uma outra coisa
aconteceu durante essa transição: o movimento perdeu o seu nome. Em
1951, Friedman se satisfazia com a descrição de si mesmo como
neoliberal. Mas, logo depois disso, o termo começou a desaparecer.
Ainda desconhecido, mesmo à medida em que a ideologia tornava-se
mais nítida e o movimento mais coerente, o nome perdido não foi
substituído por nenhuma alternativa.
No início, apesar
de seu generoso financiamento, o neoliberalismo manteve-se nas
margens. O consenso pós-guerra era quase universal: as prescrições
econômicas de John Maynard Keynes foram amplamente aplicadas. Pleno
emprego e combate à fome eram metas comuns nos EUA e na maior parte
da Europa Ocidental. As aliquotas máximas do imposto eram altas e os
governos buscavam resultados sociais elevados sem constrangimento,
desenvolvendo novos serviços públicos e redes de segurança.
Nos anos 1970,
contudo, quando as políticas keynesianas começaram a desmoronar e
as crises econômicas atingiram EUA e Europa, as ideias neoliberais
começaram a entrar no mainstream. Como Friedman ressaltou, “quando
chega a hora, é preciso mudar … havia ali uma alternativa pronta
para ser agarrada”. Com a ajuda de jornalistas simpáticos à ideia
e conselheiros políticos, alguns elementos do neoliberalismo,
principalmente suas prescrições de política monetária, foram
adotadas pelos governos de Jimmy Carter, nos EUA, e Jim Callaghan, na
Grã Bretanha.
Depois que Margaret
Thatcher e Ronald Reagan assumiram o poder, o resto do pacote veio a
galope: cortes maciços nos impostos dos ricos, esmagamento dos
sindicatos, desregulação, privatização, terceirização e
competição nos serviços públicos. Por meio do FMI, do Banco
Mundial, do Tratado de Maastricht e da Organização Mundial de
Comércio, as políticas neoliberais foram impostas –
frequentemente sem consenso democrático – em grande parte do
mundo. O mais notável é que foram adotadas por partidos que no
passado pertenceram à esquerda: Trabalhista, na Inglaterra, e
Democrata, nos Estados Unidos, por exemplo. Como observa Stedman
Jones, “é difícil pensar em outra utopia que tenha sido realizada
tão completamente.”
Pode parecer
estranho que uma doutrina que promete escolhas e liberdade possa ter
sido promovida sob o slogan “não há alternativa”. Mas, como
observou Hayek em uma visita ao Chile de Pinochet – uma das
primeiras nações em que o programa foi exaustivamente aplicado –
“minha preferência pessoal inclina-se na direção de uma ditadura
liberal, ao invés de um governo democrático que não pratique o
liberalismo”. A liberdade que o neoliberalismo oferece, que soa tão
fascinante quando expressa em termos gerais, acaba por significar a
liberdade para a elite, não para os peixes pequenos.
Liberdade em relação
aos sindicatos e à negociação coletiva significa liberdade para
reprimir salários. Liberdade em relação da regulamentação
significa liberdade de envenenar rios, colocar em risco os
trabalhadores, cobrar taxas iníquas de juros e criar instrumentos
financeiros exóticos. Ficar livre de impostos significa ficar livre
da distribuição de riqueza que tira as pessoas da pobreza.
Como Naomi Klein
documenta em The Shock Doctrine (A Doutrina do Choque), teóricos
neoliberais advogam o uso de crises para impor políticas impopulares
enquanto as pessoas estavam distraídas: por exemplo, a consequência
do golpe de Pinochet, da guerra do Iraque e do Furacão Katrina, que
Frieman descreveu como “uma oportunidade para reformar radicalmente
o sistema educacional” em New Orleans.
Onde as políticas
neoliberais não podem ser impostas domesticamente, elas são
impostas internacionalmente, através de tratados comerciais que
incorporam os “painéis de disputa estado-investidor”: tribunais
globais em que as corporações podem pressionar pela revogação de
leis e normas que protegem direitos sociais e ambientais. Quando
parlamentares votaram para restringir as vendas de cigarro, proteger
reservatórios de água das companhias de mineração, congelar
contas de energia ou prevenir empresas farmacêuticas de esfolar o
Estado, as empresas entraram com processos, muitas vezes bem
sucedidos. A democracia reduz-se a um teatro.
Outro paradoxo do
neoliberalismo é que a competição universal apoia-se em comparação
e quantificação universal. O resultado é que trabalhadores,
desempregados e serviços públicos em geral ficam sujeitos a um
sistema de avaliação e monitoramento sufocante e enganador,
desenhado para identificar vencedores e punir perdedores. Ao invés
de nos libertar do pesadelo burocrático do planejamento central,
como propôs Von Mises, ele criou um.
O neoliberalismo não
foi concebido como um projeto egoísta, mas rapidamente
transformou-se nisso. O crescimento econômico tornou-se visivelmente
mais lento na era neoliberal (desde 1980 na Grã Bretanha e nos EUA)
do que era nas décadas precedentes; mas não para os ultra ricos. A
desigualdade na distribuição de renda e riqueza, depois de 60 anos
de queda, aumentou rapidamente na nova era, devido à destruição
dos sindicatos, à redução dos impostos, ao aumento dos aluguéis,
à privatização e à desregulação.
A privatização ou
mercantilização de serviços públicos tais como energia, água,
ferrovias, saúde, educação, estradas e prisões habilitou as
grandes empresas a colocar uma cabina de pedágio diante de bens
essenciais e cobrar rendas, seja dos cidadãos ou do governo, para
seu próprio benefício. Renda é um eufemismo para dinheiro ganho
sem esforço. Quando você paga um preço inflacionado pelo bilhete
de metrô, somente parte da tarifa compensa os operadores por seus
custos de combustível, salários e outros gastos. O resto reflete o
fato de que você está nas mãos deles.
As pessoas que
possuem e administram os serviços privatizados ou semi privatizados
do Reino Unido fazem fortunas tremendas investindo pouco e cobrando
muito. Na Rússia e na Índia, os oligarcas adquiriram bens estatais
através de leilões. No México, Carlos Slim teve garantido o
controle de quase todos os serviços de telefonia fixa e móvel e
logo tornou-se o homem mais rico do mundo.
A financeirização,
como nota Andrew Sayer em Why We Can’t Afford the Rich, teve
impacto semelhante. “Como a renda”, diz ele, “os juros são
receita acumulada sem qualquer esforço”. À medida em que os
pobres tornam-se mais pobres e os ricos mais ricos, o rico adquire
controle crescente sobre outro bem crucial: dinheiro. Pagamentos de
juros são, de modo devastador, transferência de dinheiro do pobre
para o rico. Os preços dos imóveis e a redução de investimentos
estatais sobrecarregam as pessoas com dívidas; mas os bancos e os
executivos nadam de braçadas.
Sayer argumenta que
as últimas quatro décadas caracterizaram-se por uma transferência
de riqueza não apenas do pobre para o rico, mas no interior das
categorias de riqueza: daqueles que ganham dinheiro produzindo novos
bens ou serviços para aqueles que ganham dinheiro assumindo o
controle de ativos já existentes e recolhendo rendas, juros ou
ganhos de capital. O ganho produtivo foi superado pelo ganho
improdutivo.
As políticas
neoliberais estão assoladas por falhas do mercado em todos os
lugares. Não apenas os bancos, mas também as corporações
encarregadas de entregar os serviços públicos são grandes demais
para falir. Como Tony Judt apontou em Ill Fares the Land, Hayek
esqueceu-se de que os serviços públicos vitais não podem entrar em
colapso, o que significa que a competição não pode determinar seu
curso. As empresas levam os lucros, o Estado fica com o risco.
Quanto maior seu
fracasso, mais extremada se torna a ideologia. Os governos usam as
crises neoliberais tanto como desculpa quanto como oportunidade para
baixar impostos, privatizar os serviços públicos restantes, abrir
brechas na rede de proteção social, desregular as corporações e
re-regular os cidadãos. O Estado que se odeia afunda os dentes em
cada órgão do setor público.
Talvez o impacto
mais perigoso do neoliberalismo não seja a crise econômica, mas a
crise política que causou. Conforme se reduz o domínio do Estado,
reduz-se também a possibilidade de mudar o curso de nossas vidas por
meio do voto. Ao contrário, assegura a teoria neoliberal, as pessoas
podem exercer a escolha pelo consumo. Mas alguns têm mais do que
outros para gastar: na grande democracia do consumidor ou do
acionista, os votos não são igualmente distribuídos. O resultado é
um desempoderamento dos pobres e das classes médiass. Conforme os
partidos de direita e a ex-esquerda adotam políticas neoliberais
semelhantes, o desempoderamento transforma-se em privação dos
direitos civis. Um grande número de pessoas foi varrido da política.
Chris Hedges observa
que “movimentos fascistas constroem suas bases não entre as
pessoas politicamente ativas, mas entre as politicamente inativas, os
‘perdedores’ que sentem, frequentemente de modo correto, que não
têm voz ou papel a desempenhar no establishment politico”. Quando
o debate político não faz mais sentido para nós, as pessoas
tornam-se suscetíveis a slogans, símbolos e sensações. Para os
admiradores de Trump, por exemplo, fatos e argumentos parecem
irrelevantes.
Tony Judt explicou
que quando a espessa rede de interações entre as pessoas e o Estado
é reduzida a nada, a não ser autoridade e obediência, a única
força remanescente a nos unir é o poder estatal. O totalitarismo
temido por Hayek tem mais probabilidade de emergir quando os
governos, tendo perdido a autoridade moral que emana da garantia de
serviços públicos, são reduzidos a “persuadir, ameaçar e em
última análise coagir as pessoas a obedecê-los.”
Como o comunismo, o
neoliberalismo é o Deus que falhou. Mas esta doutrina zumbi continua
sua escalada, e uma das razões para isso é o anonimato. Ou antes,
um conjunto de anonimatos.
A doutrina invisível
da mão invisível é promovida por investidores invisíveis.
Devagar, muito devagar, começamos a descobrir o nome de alguns
deles. Descobrimos que o Institute of Economic Affairs , que
argumentou fortemente na mídia contra a regulação da indústria do
tabaco, foi secretamente fundado, em 1963, pela British American
Tobacco. Descobrimos que Charles e David Koch, dois dos homens mais
ricos do mundo, fundaram o instituto que criou o movimento Tea Party.
Descobrimos que Charles Koch, ao instalar um de seus thinktanks,
observou que “para evitar críticas indesejáveis, o modo como a
organização é controlada e dirigida não deveria ser amplamente
divulgada”.
As palavras usadas
pelo neoliberalismo com frequência mais ocultam do que elucidam. “O
mercado” soa como um sistema natural que pode nos pressionar por
igual, como fazem a pressão atmosférica ou da gravidade. Mas está
carregado de relações de poder. O que “o mercado quer” tende a
significar o que as corporações e seus patrões querem.
“Investimento”, como nota Sayer, significa duas coisas bem
diferentes. Uma é o financiamento de atividades produtivas e
socialmente úteis; a outra é a compra de bens existentes para deles
extrair rendas, juros, dividendos e ganhos de capital. Ao usar a
mesma palavra para atividades diferentes, “camuflam-se as fontes de
riqueza”, levando-nos a confundir extração de riqueza com criação
de riqueza.
Há um século, os
novos ricos eram desprezados por aqueles que tinham herdado seu
dinheiro. Empreendedores buscavam aceitação social transformando-se
em rentistas. Hoje, a relação foi invertida: os rentistas e
herdeiros definem-se como empresários. Eles afirmam ter construído
aq riqueza pela qual não trabalharam.
Esse anonimato e
essas confusões se misturam com o fato de o capitalismo moderno não
ter nem nome nem lugar. O modelo de terceirizações assegura que os
trabalhadores não saibam para quem trabalham. As companhias são
registradas através de um sistema secreto de rede de offshores, tão
complexo que nem mesmo a polícia pode descobrir seus proprietários
e beneficiados. Os arranjos fiscais logram os governos. Ninguém
entende os “produtos financeiros”.
O anonimato do
neoliberalismo é ferozmente salvaguardado. Aqueles que são
influenciados por Hayek, Mises e Friedman tendem a rejeitar o termo,
sustentando – com alguma justiça – que ele é hoje usado apenas
pejorativamente. Mas não nos oferecem substitutos. Alguns
descrevem-se como liberais ou ulta-liberais (libertarians) clássicos,
mas essas descrições são ambas enganosas e curiosamente
autodissipadoras, uma vez que sugerem não haver nada de novo em O
Caminho da Servidão (The Road to Serfdom), Bureocracy ou o clássico
trabalho de Friedman, Capitalismo e Liberdade (Capitalism and
Freedom).
Por tudo isso, há
algo admirável sobre o projeto neoliberal, ao menos em seus estágios
iniciais. Era uma filosofia distinta e inovadora, promovida por uma
rede coerente de pensadores e ativistas com um claro plano de ação.
Era paciente e persistente. O Caminho da Servidão (The Road to
Serfdom) tornou-se o caminho para o poder.
O triunfo do
neoliberalismo reflete também o fracasso da esquerda. Quando a
teoria do laissez-faire econômico levou à catástrofe em 1929,
Keynes inventou uma extensa teoria econômica para substituí-la.
Quando o gerenciamento da demanda keynesiana bateu no teto, nos anos
70, havia, pronta, uma alternativa conservadora. Mas quando o
neoliberalismo desmoronou, em 2008, não havia nada. É por isso que
o zumbi anda. Em 80 anos, a esquerda e o centro não produziram um
novo sistema geral de pensamento econômico.
Toda invocação de
Lord Keynes é uma admissão de fracasso. Propor soluções
keynesianas às crises do século 21 é ignorar três problemas
óbvios. É difícil mobilizar as pessoas em torno de velhas ideias;
as falhas expostas nos anos 1970 não desapareceram; e, mais
importante, o projeto não tem nada a dizer sobre nosso problema mais
grave: a crise ambiental. O keynesianismo funciona pelo estímulo da
demanda de consumo para promover crescimento econômico. Demanda de
consumo e crescimento econômico são os motores da destruição
ambiental.