11 março, 2017

MSPL assume a direção do Sindijus pela terceira vez



Na última quinta, 23 de fevereiro, foi realizada a cerimônia de posse da nova direção do Sindijus para o triênio 2017-2019. O evento aconteceu na Sede Cultural do sindicato e contou com as atrações artísticas da Quinta Cultural. Compareceram dezenas de servidores do Tribunal de Justiça de Sergipe e representantes de outras entidades sindicais de Sergipe e de outros estados, que lotaram o auditório da sede.

Às 19 horas deu-se início à cerimônia de posse com uma mesa composta pelo dirigente Gilvan Santos, agora responsável pela coordenação de Relações Institucionais e Comunicação; Alexandre Santos, coordenador regional Nordeste da Fenajud (Federação dos Sindicatos do Poder Judiciário nos Estados) e membro do SindJustiça (Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Rio Grande do Norte); Roberto Silva, secretário de Formação da Central Única dos Trabalhadores em Sergipe (CUT/SE), e Heverton Ramon, representante do Conselho Regional de Serviço Social em Sergipe (Cress).

De acordo com Gilvan Santos, nesse momento de retirada de direitos e de desafios para os trabalhadores, “resistência” será uma das palavras do movimento sindical como um todo e, principalmente, das ações do Sindijus. Entre os desafios da categoria, pensar no modelo de Judiciário que se tem e se quer, é um deles. “Hoje temos um Judiciário que privilegia o patrimônio em detrimento à vida, e temos que lutar para inverter essa lógica. Um Judiciário ágil em processos de reintegração de posse, mas extremamente lento em processos de garantia de direitos sociais”. Além disso, a luta contra os privilégios no Judiciário sergipano continuará sendo uma das mais importantes bandeiras.

Ele também fez uma fala de homenagem aos companheiros que estão deixando a direção do sindicato. “Eles cumpriram um papel importante nos últimos três anos. Ednaldo, Fernanda e Analice saem da direção, mas com certeza não sairão da luta”. A nova direção terá uma renovação de mais de 40% e esse fato é mais um ponto positivo na atuação do Sindijus. Por fim, Gilvan agradeceu em nome dos todos ao trabalho da comissão eleitoral e de todos servidores que foram voluntários para trabalharem como mesários no dia das eleições do sindicato.

Desfeita a mesa inicial, a comissão eleitoral foi chamada para, junto à nova Diretoria, oficializar a passagem de bastão com a assinatura no livro de posse. Os novos diretores são integrantes da corrente que dirigiu o sindicato nos últimos anos, Movimento Sindicato É Para Lutar (MSPL). A chapa foi eleita no dia 8 de fevereiro com 922 votos, 98,8% dos votos válidos.

Com o ato da assinatura, a cerimônia foi encerrada, sendo seguida pela parte lúdica do evento, que contou com uma exposição fotográfica mostrando algumas ações da gestão anterior (2014-2016) e as atrações musicais, Quarteto in Choro e Samuel Sertanejo.



Continuidade da luta

A posse da nova direção marca, ao mesmo tempo, a oportunidade de renovação na direção do sindicato e a continuidade de enfrentamento das questões que prejudicam os trabalhadores do Judiciário.

Para a servidora Célia Regina, as perspectivas futuras de atuação do Sindijus são positivas. “Acredito que vai existir uma unicidade nessa passagem de direção, porque os valores e a maneira de gerir é a mesma, é democrática e visando o bem do coletivo. Uma gestão transparente, em prol dos direitos de todos, apesar do momento e de discurso de crise, a gestão não engole esse discurso e estamos juntos buscando ser reconhecidos enquanto categoria”, declarou.

O evento também contou com a presença de vários servidores aposentados. Uma delas foi Maria Raimunda dos Santos. Em sua opinião, os servidores do TJSE têm “um sindicato que trabalha muito bem”. “Vimos na cerimônia que eles irão continuar com o mesmo trabalho de sempre, nos ajudando e visando proteger os direitos dos trabalhadores, que já são muito exíguos. Esse sindicato vem trabalhando com muito afinco e firmeza no sentido de deixar os funcionários numa situação melhor”, disse.

Os representantes do Escritório Advocacia Operária, parceiros do Sindijus há anos, destacaram que o sindicato é atuante em todas as frentes, não ficando refém da burocracia. De acordo com os advogados Meirivone Aragão e Lucas Rios, o Sindijus atua na luta política e na luta jurídica para defender seus sindicalizados.

Para Lucas Rios, é importante perceber a dimensão da atuação do sindicato. “Espero que o Sindijus continue na linha que vem adotando, pois vem sendo comandado por uma corrente que, na verdade, redimensionou o sindicalismo dos servidores do Tribunal de Justiça. Existe o antes e o depois da entrada desse grupo”, aponta.

Nesse momento especialmente, a gente acredita que onde a luta pode se fortalecer para combater tudo isso que está acontecendo aí é através das instituições como os sindicatos. A política hoje passa por uma crise imensa no país inteiro, as pessoas não se identificam mais com a luta político-partidária, mas, em compensação, com as lutas sindicais se identificam e muito. A gente acredita nessa luta e trabalha para isso”, afirmou Meirivone.

De acordo com a maioria dos representantes de outras entidades que também atuam na defesa dos direitos e por conquistas da classe trabalhadora, a firmeza de combate da direção tem sido uma inspiração para a luta tanto em Sergipe quanto no Brasil. Alexandre Santos, representante da Fenajud, avalia que o Sindijus vem construindo uma seriedade na discussão do movimento sindical. “Na realidade, ele é uma referência para todos nós. E é com muita alegria e satisfação que digo que o Sindijus Sergipe é um dos sindicatos mais importantes da categoria dos sindicatos dos servidores do Judiciário nos Estados e nos dá aula de como se deve fazer o sindicalismo, principalmente com relação à renovação dos seus quadros e seriedade com que leva a política”.

Uma direção combativa, que preza pelo centralismo democrático, de ouvir sempre a base nas tomadas de decisão, a base sendo priorizada para decidir o rumo do sindicato. Um sindicato que preza pelos princípios de democracia interna, da independência perante partidos, perante Governos e gestores. Uma direção que, de fato, tem o seu princípio de autonomia e a liberdade sindical”. Essa é a visão de Roberto Santos, secretário de Formação da CUT em Sergipe. “A CUT poderá sempre contribuir com a formação e na reflexão, fortalecendo ainda mais seus princípios”, pontua.

A opinião de Itanamara Guedes, da Federação Estadual dos Trabalhadores do Serviço Público Municipal de Sergipe (Fetam), é de concordância com as demais falas em relação à atuação do sindicato e das perspectivas sobre os próximos anos. “Tem sido um grande exemplo, que tem impulsionado a luta geral dos sindicatos de Sergipe. Acredito que a gestão dará continuidade a essa luta de fortalecimento interno da categoria e também de participação de lutas gerais dos trabalhadores e trabalhadoras de Sergipe”.

As demais entidades, como o Sintese e o Sindijor, acrescentaram que a importância de se ter uma entidade que visa o combate ao Poder Judiciário, o mais blindados entre os três Poderes.
Espero que o Sindijus continue trilhando pelo caminho que eles veem desde quando esse grupo assumiu o comando, que é fazendo um sindicalismo com responsabilidade, forte, autêntico, que briga de forma rígida por sua categoria, que não se intimida com as possíveis intimidações do Poder Judiciário. Tem sido um exemplo não somente para o Sindijor, para os demais sindicatos de Sergipe e do Brasil. A gente vê claramente que é um grupo que valoriza e luta pelos interesses dos servidores públicos e confronta o Poder Judiciário, que é um Poder prepotente, arrogante, ainda mais para essa classe trabalhadora. Então se percebe o quanto são corajosos e quanto temos que render homenagens porque eles estão lutando contra o Poder que tem o poder da caneta. Isso não é pouca coisa”, disse o presidente do Sindicato dos Jornalistas em Sergipe (Sindijor), Paulo Sousa.

Ivonete Cruz, presidente de Sintese, que participou pela segunda vez de uma posse do Sindijus, declarou total apoio à luta da categoria. “Muito positiva a forma como o sindicato organizou os trabalhadores do Judiciário, um espaço onde se tem a impressão de que todos são marajás, de que todos ganham bem, é preciso separar quem de fato são os trabalhadores e organizar a luta da resistência. E esse grupo tem mostrado muita força e muita denúncia sobre o que representa o Judiciário. Nós que fazemos o Sintese damos total apoio e estaremos sempre juntos como trabalhadores e trabalhadoras, principalmente nesse momento que vivemos, com um grande processo de retirada de direitos. A continuidade de luta do Sindijus é extremamente importante para continuar fazendo a resistência”.


02 fevereiro, 2017

Propostas do MSPL para o próximo triênio do Sindijus/SE, 2017-2019

Conheça as propostas da chapa do Movimento Sindicato é Pra Lutar (MSPL) para o próximo mandato da direção do Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário de Sergipe (Sindijus/SE):


🔴 NA CONCEPÇÃO SINDICAL E POLÍTICA DE VALORIZAÇÃO DOS TRABALHADORES DO TJSE

Continuar o modelo de sindicalismo promovido nos últimos anos pelo Sindijus:
  • Independente em relação à gestão do Tribunal de Justiça de Sergipe;
  • Classista pelo pertencimento à classe trabalhadora; e, acima de tudo,
  • Democrático em sua relação com os sindicalizados, visando à construção coletiva dos rumos da categoria.

No campo da valorização dos trabalhadores do Tribunal de Justiça de Sergipe, propor:
  • A construção democrática de um anteprojeto de Plano de Carreira que contemple efetivamente elementos de carreira, tendo em vista que o “Plano de 2010” acarretou perdas nas letras e nenhum avanço salarial aos servidores com mais tempo de serviço e aposentados, assim como aprofundou as desigualdades salariais no TJSE.
  • Continuar desenvolvendo pautas e estratégias que busquem distribuir, de forma mais igualitária, os recursos financeiros para gastos com pessoal no TJSE, tendo como eixo central a valorização dos servidores efetivos, garantindo-se a preservação dos direitos já conquistados.
  • Defender a valorização do serviço público.
  • Defesa do concurso público e luta contra formas de precarização do trabalho.

🔴 ADMINISTRAÇÃO E FINANÇAS
  • Administrar o sindicato com transparência e participação dos sindicalizados na gerência do patrimônio, mantendo os espaços de deliberação, a exemplo da elaboração do orçamento anual, e de deliberações sobre compra e venda de imóveis e veículos.
  • Zelar pela conservação das instalações físicas da entidade, a fim de proporcionar maior conforto aos sindicalizados e para execução das lutas dos trabalhadores.
  • Ampliar a realização de convênios, a fim de oferecer serviços de interesse dos sindicalizados.

🔴 SECRETARIA GERAL
  • Garantir a gestão democrática do sindicato através da participação dos servidores da capital e do interior em todas as instâncias da entidade.
  • Intensificar a realização de plenárias de base na capital e no interior, visando estreitar o diálogo, coletar propostas e ouvir os problemas dos locais de trabalho.
  • Assegurar a gestão documental que permita o aprimoramento funcional da entidade.

🔴 RELAÇÕES INSTITUCIONAIS E COMUNICAÇÃO
  • Ampliar as relações institucionais e de cooperação com outras entidades sindicais da classe trabalhadora e demais setores explorados da sociedade civil.
  • Manter a comunicação como um instrumento estratégico para fornecer a todos os sindicalizados o mesmo nível de informação e preservar o diálogo com a população, na busca de apoio social para as lutas da categoria, utilizando, inclusive, novos canais de comunicação.
  • Utilizar a Comunicação como ferramenta de fortalecimento da classe trabalhadora para fazer frente ao atual cenário de avanço de políticas de retirada de direitos.

🔴 SAÚDE DO TRABALHADOR
  • Exigir a adoção de políticas de saúde pelo Tribunal de Justiça de Sergipe que garantam a integridade física e psíquica na vida dos trabalhadores.
  • Atuar no Comitê Gestor Local de Atenção à Saúde do TJSE, no intuito de fomentar e fiscalizar programas, projetos e ações vinculados à saúde do trabalhador para fins de implementação do descanso remunerado de 10 minutos a cada 50 minutos de trabalho, fim do semáforo no SCPV e melhorias na qualidade do serviço do Centro Médico.
  • Realizar campanhas preventivas e de combate às doenças laborais, como as advindas da virtualização do processo do trabalho e do assédio moral.

🔴 ASSUNTOS JURÍDICOS
  • Assegurar assessoria jurídica aos sindicalizados nas questões salariais e funcionais, em todas as áreas de atuação: administrativa, cível, penal e previdenciária.
  • Manter o atendimento da assessoria jurídica dentro do próprio sindicato semanalmente e no escritório contratado diariamente.
  • Divulgar informações atualizadas sobre a tramitação dos processos relacionados a interesses individuais ou coletivos da categoria.
  • Formar, democraticamente, coletivos compostos por sindicalizados da base para acompanhar e tomar decisões na condução dos processos coletivos históricos, como URVs, mandado de injunção, interníveis etc.
  • Acompanhar os projetos de lei relacionados aos interesses da categoria e apresentar posicionamentos do sindicato aos parlamentares.
  • Acompanhar nos Tribunais Superiores e Conselho Nacional de Justiça a elaboração de normas e jurisprudências de interesse da categoria e da classe trabalhadora.
  • Permanentemente, manter a categoria informada sobre a legislação do seu interesse e interpretação das novas normas.

🔴 APOSENTADOS E PENSIONISTAS
  • Manter um canal de comunicação ativo que garanta a inclusão dos aposentados e pensionistas nas atividades desenvolvidas pelo sindicato.
  • Manter as visitas pessoais, estreitando as relações entre o sindicato e os aposentados/pensionistas, a fim de ouvir seus anseios e criar atividades específicas.
  • Manter os espaços de integração dos aposentados e pensionistas, a exemplo do Encontro Anual e da Confraternização Natalina.

🔴 FORMAÇÃO SINDICAL
  • Dar continuidade aos espaços de formação sindical para representantes de base e demais servidores, enquanto instrumento de discussão para construção de uma sociedade mais justa e igualitária e de um Judiciário que atenda os anseios de seus trabalhadores e da sociedade.
  • Ampliar os meios de formação sindical com desenvolvimento de políticas de formação no ambiente de trabalho.

🔴 POLÍTICAS SOCIAIS
  • Construir e aperfeiçoar as políticas sociais sindicais baseadas na ocupação democrática do solo, na preservação do meio ambiente, no respeito à igualdade de gênero, à diversidade de opção sexual e aos direitos humanos e na luta pela democratização do Judiciário.
  • Estreitar, ainda mais, os laços do Sindijus com as mais diversas entidades sindicais e da sociedade civil, de modo a contribuir para o fortalecimento da solidariedade de classe.

🔴 CULTURA E LAZER
  • Realizar projetos culturais e de lazer, com o intuito de garantir espaços confortáveis de formação e de integração para sindicalizados, como ocorre na Ressaca Junina.
  • Realizar projetos que estimulem a prática esportiva pelos sindicalizados.




03 janeiro, 2017

MSPL foi a única chapa inscrita nas eleições da Direção do Sindijus 2017

No último dia 28, encerrou mais uma etapa das eleições para a Diretoria, o Conselho Fiscal e Suplentes do Sindijus, para o próximo triênio, 2017-2019, que acontecerão no próximo dia 08 de fevereiro. Foi encerrada a etapa das inscrições de chapas.

Nessa fase, apenas o Movimento Sindicato é Pra Lutar (MSPL) inscreveu chapa, grupo da situação que atualmente dirige o sindicato.


Mesmo sendo chapa única inscrita o processo eleitoral deve seguir normalmente o rito previsto no Estatuto da entidade e no Regimento Eleitoral. 


01 janeiro, 2017

Revolução Russa, ano 100

Aventura soviética teve limites, contradições e misérias, mas ao menos um enorme mérito. Ela demonstrou que havia alternativa ao capitalismo e o obrigou a recuar


Por Boaventura de Sousa Santos*

Assinalam-se este ano os 100 anos da Revolução Russa (RR)1 e também os 150 anos da publicação do primeiro volume de Das Kapital de Karl Marx. Juntar as duas efemérides pode parecer estranho porque Marx nunca escreveu em detalhe sobre a revolução e a sociedade comunista e, se tivesse escrito, é inimaginável que o que escrevesse tivesse alguma semelhança com o que foi a União Soviética (URSS), sobretudo depois que Stalin assumiu a liderança do partido e do Estado. A verdade é que muitos dos debates que a obra de Marx suscitou durante o século XX, fora da URSS, foram um modo indireto de discutir os méritos e os deméritos da RR. Agora, que as revoluções feitas em nome do marxismo ou terminaram ou evoluíram para… o capitalismo, talvez Marx (e o marxismo) tenha finalmente a oportunidade de ser discutido como merece – como teoria social. A verdade é que o livro de Marx, que levou cinco anos a vender os primeiros mil exemplares antes de se tornar um dos livros mais influentes do século XX, voltou a ser um bestseller em tempos recentes e, duas décadas depois da queda do Muro de Berlim, estava finalmente a ser lido em países que tinham sido parte da URSS. Que atração poderá suscitar um livro tão denso? Que apelo pode ter num momento em que tanto a opinião pública como a esmagadora maioria dos intelectuais estão convencidos de que o capitalismo não tem fim e que, se tiver, não será certamente seguido pelo socialismo? Há 23 anos anos publiquei um texto sobre o marxismo como teoria social.2 Numa próxima coluna indicarei o que desde então mudou e não mudou na minha opinião e procurarei responder a estas perguntas. Hoje debruço-me sobre a o significado da Revolução Russa.

Muito provavelmente os debates que durante este ano tiverem lugar sobre a Revolução Russa irão repetir tudo o que já foi dito e debatido e terminarão com a mesma sensação de que é impossível um consenso sobre se a RR foi um êxito ou um fracasso. À primeira vista é estranho que assim seja, pois quer se considere que a RR terminou com a chegada de Stalin ao poder (a posição de Trotsky, um dos líderes da revolução) ou com o golpe de Estado de Boris Yeltsin em 1993, parece evidente que fracassou. E, no entanto, tal não é evidente, e a razão não está na avaliação do passado mas na avaliação do nosso presente. O triunfo da RR reside em ter levantado todos os problemas com que as sociedades capitalistas se debatem ainda hoje. O seu fracasso reside em não ter resolvido nenhum. Excepto um. Em próximas colunas abordarei alguns dos problemas que a RR não resolveu e nos continuam a apoquentar. Hoje debruço-me sobre o único problema que ela resolveu.

Pode o capitalismo promover o bem estar das grandes maiorias sem que esteja no terreno da luta social uma alternativa credível e inequívoca? Este foi o problema que a RR resolveu e a resposta é não. A RR mostrou às classes trabalhadoras de todo mundo, e muito especialmente às europeias, que o capitalismo não era uma fatalidade, que havia uma alternativa à miséria, à insegurança do desemprego iminente, à prepotência dos patrões, a governos que serviam os interesses de minorias poderosas mesmo quando diziam o contrário. Mas a RR ocorreu num dos países mais atrasados da Europa e Lenine tinha plena consciência de que o êxito da revolução socialista mundial e da própria RR dependia de ela poder estender-se aos países mais desenvolvidos, com sólida base industrial e amplas classes operárias. Na altura, esse país era a Alemanha. O fracasso da revolução alemã de 1918-1919 fez com que o movimento operário se dividisse e uma boa parte dele passasse a defender que era possível atingir os mesmos objetivos por vias diferentes da seguida pelos operários russos. Mas a ideia da possibilidade de uma sociedade alternativa à sociedade capitalista manteve-se intacta. Consolidava-se, assim, o que se passou a designar por reformismo, o caminho gradual e democrático para uma sociedade socialista que combinasse as conquistas sociais da RR com as conquistas políticas, democráticas dos países ocidentais. No pós-guerra o reformismo dava origem à social-democracia europeia, um sistema político que combinava altos níveis de produtividade com altos níveis de proteção social. Foi então que as classes trabalhadoras puderam, pela primeira vez na história, planejar a sua vida e futuro dos seus filhos. Educação, saúde e segurança social públicas, entre muitos outros direitos sociais e laborais. Tornou-se claro que a social democracia nunca caminharia para uma sociedade socialista mas que parecia garantir o fim irreversível do capitalismo selvagem e a sua substituição por um capitalismo de rosto humano.

Entretanto, do outro lado da “cortina de ferro”, a República Soviética (URSS), apesar do terror de Stalin, ou precisamente por causa dele, revelava um pujança industrial portentosa que transformava em poucas décadas uma das regiões mais atrasadas da Europa num potência industrial que rivalizava com o capitalismo ocidental e, muito especialmente com os EUA, o país que emergira da segunda guerra mundial como o mais poderoso do mundo. Esta rivalidade veio a traduzir-se na Guerra Fria que dominou a política internacional nas décadas seguintes. Foi ela que determinou o perdão em 1953 de boa parte da imensa dívida da Alemanha Ocidental contraída nas duas guerras que inflingira à Europa e perdera. Era preciso conceder ao capitalismo alemão ocidental condições para rivalizar com o desenvolvimento da Alemanha Oriental, então a república soviética mais desenvolvida. As divisões entre os partidos que se reclamavam da defesa dos interesses dos trabalhadores (os partidos socialistas ou social-democratas e os partidos comunistas) foram uma parte importante da Guerra Fria, com os socialistas a atacarem os comunistas por serem coniventes com os crimes de Stalin e defenderem a ditadura soviética, e os comunistas a atacarem os socialistas por terem traído a causa socialista e serem partidos de direita muitas vezes ao serviço do imperialismo norte-americano. Mal podiam imaginar então o muito que os unia.

Entretanto, o Muro de Berlim caiu em 1989 e pouco depois colapsou a URSS. Era o fim do socialismo, o fim de uma alternativa clara ao capitalismo, celebrado incondicional e desprevenidamente por todos os democratas do mundo. Entretanto, para surpresa de muitos, consolidava-se globalmente a versão mais anti-social do capitalismo do século XX, o neoliberalismo, progressivamente articulado (sobretudo a partir da presidência de Bill Clinton) com a dimensão mais predadora da acumulação capitalista: o capital financeiro. Intensificava-se a guerra contra os direitos econômicos e sociais, os ganhos de produtividade desligavam-se das melhorias salariais, o desemprego voltava como o fantasma de sempre, a concentração da riqueza aumentava exponencialmente. Era a guerra contra a social-democracia que na Europa passou a ser liderada pela Comissão Europeia, sob a liderança de Durão Barroso, e pelo Banco Central Europeu.

Os últimos anos mostraram que, com a queda do Muro de Berlim, não colapsou apenas o socialismo, colapsou também a social-democracia. Tornou-se claro que os ganhos das classes trabalhadoras das décadas anteriores tinham sido possíveis porque a URSS e a alternativa ao capitalismo existiam. Constituíam uma profunda ameaça ao capitalismo e este, por instinto de sobrevivência, fizera as concessões necessárias (tributação, regulação social) para poder garantir a sua reprodução. Quando a alternativa colapsou e, com ela, a ameaça, o capitalismo deixou de temer inimigos e voltou à sua vertigem predadora, concentradora de riqueza, aprisionado na sua pulsão para, em momentos sucessivos, criar imensa riqueza e destruir imensa riqueza, nomeadamente humana. Desde a queda do Muro de Berlim estamos num tempo que tem algumas semelhanças com o período da Santa Aliança que, a partir de 1815 e após a derrota de Napoleão, procurou varrer da imaginação dos europeus todas as conquistas da Revolução Francesa. Não por coincidência e salvas as devidas proporções (as conquistas das classes trabalhadoras que ainda não foi possível eliminar por via democrática), a acumulação capitalista assume hoje uma agressividade que faz lembrar o período pré-RR. E tudo leva a crer que, enquanto não surgir uma alternativa credível ao capitalismo, a situação dos trabalhadores, dos pobres, dos imigrantes, dos aposentados, das classes médias sempre-à-beira-da-queda-abrupta-na-pobreza não melhorará significativamente. Obviamente que a alternativa não será (nem seria bom que fosse) do tipo da que foi criada pela RR. Mas terá de ser uma alternativa clara. Mostrar isto mesmo foi grande mérito da Revolução Russa.

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1 Quando me refiro à Revolução Russa refiro-me exclusivamente à Revolução de Outubro porque foi essa que abalou o mundo e condicionou a vida de cerca de um terço da população mundial nas décadas seguintes. Foi precedida da Revolução de Fevereiro do mesmo ano que depôs o Czar e que durou até 26 de Outubro (segundo o calendario juliano então em vigor na Russia), quando os Bolsheviques, liderados por Lenine e Trotsky, tomaram o poder com as palavras de ordem “ paz, pão e terra”, “todo o poder aos sovietes”, ou seja, aos conselhos de operários, camponeses e soldados.

2 Pela Mão de Alice, originalmente publicado em 1994. Pode consultar a 9ª edição revista e aumentada publicada em 2013 por Edições Almedina, p.33-56.

*Doutor em sociologia do direito pela Universidade de Yale, professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, diretor dos Centro de Estudos Sociais e do Centro de Documentação 25 de Abril, e Coordenador Científico do Observatório Permanente da Justiça Portuguesa – todos da Universidade de Coimbra.

Fonte: Outras Palavras